terça-feira, 4 de setembro de 2012

Ao longo da vida, ACM funcionou como o principal anfitrião do estado


Em meados da década de 90, o senador Antonio Carlos Magalhães recebia em Salvador, pela segunda vez, o presidente de Cuba, Fidel Castro. Enquanto travavam conversas animadas, o ícone do comunismo era aguardado ansiosamente pelas líderanças da esquerda na Bahia. Entre as quais, a prefeita da capital à época, Lídice da Mata. O encontro no apartamento do político, na Graça, era previsto para durar poucas horas. Mas, acabou varando a noite.
O episódio ilustra bem uma das qualidades do político baiano: a capacidade de funcionar como um tipo de embaixador do estado, atraindo as atenções das mais importantes personalidades do mundo da política, da religião e das artes. Mesmo que muitas delas estivessem em campos ideológicos contrários ao do senador.


O poder da atração em sentido horário: recepção ao amigo Fidel Castro, ao sul-africano Nelson Mandela e ao argentino Carlos Menem; na ABL, coma atriz Fernanda Montenegro
Até hoje, dia em que ACM completaria 84 anos, nenhum outro político baiano conseguiu magnetizar com tanto poder a atenção de personagens com assento de destaque na história recente do Brasil e do mundo. Fidel, entre outros tantos, nunca negou sua amizade com o baiano, apesar do muxoxo dos esquerdistas, que preferiam ver o símbolo máximo da resistência anticapitalista longe do adversário.
O líder cubano, que visitou Salvador pela primeira vez na Cúpula Ibero-Americana de 1993, ainda teria outro encontro com o então presidente do Senado em agosto de 1998. Para selar a amizade, presenteou ACM com uma caixa dos melhores charutos da “Ilha”, mimo que ele dividiu com outro amigo de longa data, o cardeal dom Eugênio Sales, arcebispo emérito do Rio de Janeiro.
Tal ligação entre o político baiano e “o comandante” vinha dos tempos em que ACM foi ministro das Comunicações do governo José Sarney e atuou, pessoalmente, no reatamento das relações entre o Brasil e Cuba. Coube a ACM ajudar na montagem do sistema de telecomunicações do país caribenho, o que nunca foi esquecido por Fidel.
Pelos seus gabinetes e escritórios, passaram centenas de figuras ilustres, que visitavam o estado em eventos ou eram convidados por ele. Nos arquivos fotográficos do senador baiano, morto em 20 de julho de 2007, constam imagens de encontros entre o baiano e vips de proa.
Lista que inclui chefes de Estado e líderes políticos e religiosos, como o sul-africano Nelson Mandela, o argentino Carlos Menem, o português Mario Soares, o papa João Paulo II e Mãe Menininha do Gantois; esportistas como o piloto Emmerson Fittipaldi, os jogadores Ronaldo Fenômeno, Zico, Vampeta e o boxeador Acelino Popó Freitas.
A trajetória de ACM como “embaixador da Bahia” teve um capítulo grande com figurões do universo artístico, que sempre recorriam a ele para conseguir apoio aos seus projetos. Foi anfitrião de atores como o 007 Roger Moore, Bibi Ferreira, Paulo Gracindo e o casal Fernando Torres e Fernanda Montenegro. Sem contar um de seus grandes amigos, o escritor Jorge Amado.
Dorival Caymmi, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gal Costa e Baby Consuelo foram alguns dos cantores clicados várias vezes ao lado do baiano, que em 1979, numa exposição em Entre Rios, foi homenageado por uma rima executada ao vivo por ninguém menos que Luiz Gonzaga. Presente do rei do baião para o “embaixador ACM”.


‘Nenhum político tem essa capacidade de atração’
Principal herdeiro político do senador Antonio Carlos Magalhães, o deputado federal ACM Neto (DEM) tem a exata noção do caminho a percorrer para conseguir uma parcela do poder de atração que o avô exercia sobre as personalidades.

Testemunha privilegiada de encontros e reuniões entre ACM e vips das mais variadas áreas, o parlamentar, líder do Democratas na Câmara, garantiu ao CORREIO nunca ter visto, mesmo na história recente da Bahia, um político com tamanho magnetismo sobre celebridades. 
ACM se notabilizou pela capacidade de atrair um leque amplo de personalidades para a Bahia. Será que vai existir algum político com esse mesmo poder no estado? 
É muito difícil que isso aconteça novamente na Bahia. Hoje, nenhum outro político tem essa capacidade que ele tinha, de fazer com que (as personalidades) se sentissem tão atraídas por ele, como de fato acontecia. Além do mais, ele possuía uma envergadura nacional que o permitia estabelecer uma rede de articulações muito sólida, até internacionalmente. Repetir isso é uma tarefa complicada.

E o senhor, acha que vai conseguir?
(risos) A gente trabalha para isso, mas é impossível fazer previsões. É claro que trabalhamos com esse objetivo, que não é só manter o que ele conseguiu ao longo da história, como também ampliar as conquistas. Mas, é evidente que o momento político agora é diferente do que ele viveu.

Além das articulações, que o permitiram ter um grau de visibilidade para fazer as coisas gravitarem em seu entorno, o que mais ACM possuía como característica, que possibilitava atrair tantas personalidades?
Primeiro, uma liderança bem nítida. Segundo, um jeito muito próprio de ser. ACM era um sujeito que transpirava emoção. Por um lado isso, claro, gerava repulsa em alguns, mas na maioria provocava um forte sentimento de atração.

Há algum episódio que o senhor testemunhou sobre alguém que tenha abandonado a rejeição inicial ao senador?
Olha, é difícil falar de algo específico, até por que havia muita gente com receio dele e que, depois de apenas um encontro, saía completamente seduzido. Aliás, sedução é a palavra mais correta no caso de ACM. Isso porque ouço relatos dos mais diversos a respeito dessa qualidade dele. Casos contados por gente com formação ideológica bastante distinta da que ACM tinha. Há dezenas de políticos, jornalistas, artistas, com quem tenho relações em Brasília e que sempre foram historicamente contrários a ele, mas acabaram completamente atraídos.

É o caso de Jorge Amado, cuja formação política sempre foi ligada à esquerda?
Acho que, no caso de Jorge Amado, foi diferente. ACM teve uma relação com a cultura, a arte e os ícones baianos muito especial. Não teve nenhum político que valorizasse tanto isso quanto ele. Característica que acabou gerando uma simpatia recíproca entre ele e Jorge Amado. ACM reconhecia o talento e a importância do escritor, que por sua vez admirava publicamente a postura de ACM como homem público. Admiração que vai da geração dele até a de Ivete Sangalo.

Missa para ACM acontece hoje
Acontece hoje a missa que encerra a primeira Semana Ação, Cidadania e Memória, projeto feito em comemoração ao nascimento do político Antonio Carlos Magalhães. A cerimônia começa às 10h, na Igreja São Pedro dos Clérigos (Pelourinho) e é aberta ao público.

O Instituto Antonio Carlos Magalhães também abre, excepcionalmente, das 10h às 12h do domingo, quando será possível conferir as obras de artistas como Carybé, Calazans Neto e Tati Moreno na exposição Mestres da Arte Baiana, que fica em cartaz até o dia 10 (confira detalhes e horários para visita em institutoacm.com.br).
O tema das homenagens este ano foi Arte e Cultura. Ontem, o Terreiro de Jesus foi palco de manifestações como maculelê, capoeira e samba-de-roda. Todas foram apresentadas pelos 25 artistas da Companhia de Dança e Ritmos João de Barro, grupo do bairro da Liberdade. “Nos criamos no Centro Social Urbano da Liberdade e já passamos por países como Israel, Turquia e Grécia. Se hoje temos 26 anos, é graças a ACM, que sempre incentivou a cultura”, afirmou Mestre João de Barro, responsável pela companhia.

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